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O Vento e a Gaivota

Busquei inspirações mais literárias para escrever um bom post sobre meu atual estado de espírito. Lembro-me de ter algo que falava sobre ele no Tao Te Ching, e uma referência parecida também em algum Upanishad. Todavia, desprovido dos dois textos nas minhas versões preferidas -- aquelas que posso tatear e guardar na estante, penso em rascunhar algumas linhas sobre um processo estranho que anda se passando comigo nos últimos dias.
Voltei à pratica do Hatha Yoga quase que diariamente, e quase que no automático cortei a carne de novo da minha alimentação. Depois de ter quebrado 10 anos de vegetarianismo, não é tão difícil voltar a não comer carne.
Inevitavelmente, caí no Raja Yoga, o Yoga Real, onde não só a comunhão do corpo com a mente são importantes mas também a plena consciência de todos os processos envolvidos tanto nos ásanas (as posturas), como no pranayama (exercícios respiratórios), quanto nas reações que passamos a ter diante dos processos da vida e do mundo (djnana).
Realizamos um ásana inspirado no movimento da gaivota, há duas semanas, e ele não me sai da cabeça. É uma postura que requer força, leveza e equilíbrio. Três potências extremamente conflitantes entre si, mas que perfeitamente casadas, elevam o praticante a um patamar deveras interessante. Todavia, é claro que eu não consegui conciliá-las bem -- quem dera eu já estivesse nesse estado, então continuo com o ásana na cabeça ou praticando a postura para conseguir entender onde é que está o desequilíbrio.
Ainda não consegui fazer a postura com perfeição, mas enquanto tento, me sinto mais disposto a usar a brisa marítima a meu favor para voar mais longe. Só que a brisa tem seu próprio curso, e se eu não me mantiver no vazio descrito pelo Tao, não vou conseguir acompanhá-la. Por sorte o milenar Livro das Mutações chinês, raíz e produto (atualmente) dos pensamentos de Lao Tse e de Confúcio, lança uma pista interessante sobre isso:

"O vento produz efeitos graduais e imperceptíveis. Não se deve, portanto, proceder de modo violento e sim através de uma influência constante. Efeitos dessa ordem chamam menos a atenção que aqueles que se podem conseguir com um ataque de surpresa, porém são mais duradouros e completos"
Persevero, portanto, neste ásana. Posso não estar ainda no vazio, e certamente, estou muito longe do samadhi. Mas a perseverança sinaliza que continuo caminhando... Afinal, uma das traduções para a palavra Tao não é "caminho"?
 
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