
Tive variadas e diversas experiências com mercado de trabalho desde os 14 anos, mas nenhuma tão alienante quanto minha experiência atual. Hoje, não consigo imaginar-me trabalhando com outra coisa, e toda vez que penso como estaria eu trabalhando com outras coisas, tenho um sentimento semelhante a medo em pensar no desmamar das tetas da sólida instituição financeira onde trabalho.

Esse é só mais um dos pensamentos que toma minha cabeça nesses que são os últimos dias de 2006. Não que eu acredite no fracionamento do tempo em dias e horas como se fossem realmente um marcador real de tempo, ao contrário. Só que sei que, junto com o passar desse marcador, meu corpo dá sinais de estar cada vez mais distante de seu nascimento, em uma ascenção que em algum instante transformar-se-á em declínio. Isso sim me dá medo.
Não, não é medo de morrer. É medo de não viver o suficiente.
Nasci há 23 anos e não tenho certeza de que todas as decisões que tomei foram corretas. Às vezes, foram, ora não. O fato é que apodera-se de mim um medo de estar vivendo uma existência vazia, quando poderia estar preenchendo-a com algo que ainda não sei bem o que é. Em suma, vivo há 23 anos, mas não estou bem certo de estar vivendo mesmo.
Já que o próprio "inconsciente coletivo" aceitou essa marcação de meses e anos para pontuar suas vidas, não creio ser insensato considerar o fim de ano um fim de ciclo -- com consequente início de outro. Todavia, estar consciente do samsara me faz tentar fazer com que os ciclos da minha vida não sejam circulares ou espirais, mas sim, solenóides, uma espiral crescente e ascendente, com "avanços" que destaquem-se em relação ao ponto anterior.
Que foi 2006? Quais foram as coisas que me marcaram -- se é que marcaram? Com quem e onde estive, com quem interagi, o que aprendi com tais experiências?
Me vem à cabeça, por exemplo, a experiência em São Thomé das Letras, sendo expulso da Fundação Harmonia por ter me entregado a um simples beijo e um breve romance com uma residente da comunidade que conheci há anos, quando ela ainda não morava lá. Eis o primeiro choque do ano:

Já em São Paulo, me envolvi com uma garota do Partido com quem eu outrora pretendia passar apenas uma noite, como passei e passava com outras o tempo todo. Dessa única noite, nasceu sentimento, que vivi ao longo de algum tempo de longas discussões e maduros debates, e é claro, muito sexo. Cresci com tudo isso, mas não o suficiente.
A seguir, um retrocesso, ao me envolver com uma garota que não valia mais que o metal que recobre as tampas de bueiro do centro velho da cidade. O metal, ao menos, dá lucro aos ladrões de ferro. Dessa relação, tirei que bons orgasmos podem custar muito caro, se não forem obtidos com a pessoa certa. E que alguns envolvimentos devem ser encarados com ponderação. Ponderei, paguei e me recuperei.
Aí entrei na minha fase Camila. Essa, não preciso nem comentar... Depois de um tempão pensando que não diria mais isso, abri a boca para dizer que a amava. Não menti. Amo.

E cá estou eu, sozinho. Claro, não por completo, e é difícil pra quem está à minha volta entender o porquê que, cercado de tão boas e magníficas pessoas, não quero uma namorada. No presente momento, quero alguém para viver experiências boas comigo, mas não um relacionamento.
É por tudo isso que agora quem está à minha volta pode pensar que estou ausente. Pode ser a impressão que passa, mas é completamente errônea: estou mais presente que nunca. Para mim mesmo! Presente em minha vida, em meus pensamentos, no meu coração. Entendendo quem sou eu e para onde vou. Fechado pra balanço, fazendo inventário do estoque e de bens e preparando-me para a abertura do movimento contábil de 2007. Ausente e presente. Pura e simplesmente isso.

"Desperta-te, ou vai afogar-se". "Corta os pesos mortos". "Ame-se e deixe-se amar". Eis o que um ser iluminado disse para mim no começo de 2005, ano do Sadhana, ano do exercício e do crescimento. Ano do despertar. Teria sido 2006 o ano do corte dos pesos mortos? E 2007, será o ano do ame-se?
Ensinaram-me a admirar a rosa rubra como símbolo da vida, do útero e do nascimento, do coração pulsante dentro do peito que recicla e bombeia o sangue para todas as extremidades, por mais distantes que elas sejam desse diminuto órgão. A Rosa pode não ter estado em minha janela este ano como esteve ano passado, mas certamente esteve comigo em meu coração o tempo todo. Todo o tempo. O tempo todo.
Relendo os parágrafos acima, penso também que 2006 foi um ano onde entreguei-me à má escrita, deixando o tom jornalístico e dissertativo e incorporando o estilo emotivo, cheio de ecos, neologismos e com vocabulário quase pobre. Deixei de escrever para muitos, também, e passei a expressar-me somente para os mais próximos. É uma mudança, não um erro. E eu vi minha obra. E pensei que isso era bom.
Algumas pessoas norteiam suas vidas baseadas em experiências marcantes. Outras, no seu crescimento profissional. Outras, ainda, nas pessoas com quem se envolveram. Ainda existem as que não norteiam suas vidas e pensam que acordar e dormir é um simples reflexo do nascer e por do sol.
Não sei em qual dos grupos me encaixo, embora vira e mexe resolvam encaixar-me em algum grupo. Me divirto vendo os outros tentando categorizar-me, eis aí um exercício que as pessoas adoram fazer: ponderar sobre a vida alheia e dizer que isso e aquilo está errado e certo. Isso enquanto não olham para os próprios umbigos, enquanto pensam que suas próprias experiências podem servir de base para dizer como os outros devem viver. Isso considero erro, mas também aprendi que o que eu considero erro é erro para mim, e só pra mim. É minha opção de erro. Para ser erro de outrém, tem que ser opção de outrém.


Encerro com Oswaldo, que não conheço, mas tenho certeza que é Mestre: "e que minha loucura seja perdoada. Porque metade de mim é amor, e a outra metade... também."