Beleza Rara ou Estética?

Ponho-me a meditar em uma beleza sem igual que às vezes enxergo no meu dia-a-dia. De vez em quando vejo num por do sol, certas vezes num lusque-fusque (caiu esse hifem também?) visto através da janela do metrô entre as estações Santana e Armênia, mas quando menos espero, vejo que estou contemplando a
beleza de um sorriso, do tom de voz ou tão simplesmente da presença deslumbrante de certas mulheres.
São poucas as vezes que isso acontece. Lembrei-me de Schiller falando que, quando as coisas satisfazem ao todo de nossas faculdades sensíveis sem corresponder especificamente a nenhuma dentre elas, está nos satisfazendo esteticamente. Recordo também que na filosofia indiana há um correspondente para isso, mas como não me vem à mente a palavra exata, não arrisco chutar o verbete sânscrito.
Cito meu pai, que penso eu ter concluído brilhantemente uma conversa que começamos há duas semanas com um post hoje de manhã em seu facebook, que comentarei logo a seguir:
Não sei onde li outro dia, a propósito de beleza, que existe uma nítida diferença entre a beleza de uma obra de arte e a que se vê no sexo oposto, pois a beleza da obra de arte é contemplativa e transcendente, ao passo que a beleza que posso ver numa mulher é sempre influenciada por meu instinto e meu desejo, o que lhe tolhe a contemplação e a transcendência. Pode ser. Quem sabe só possamos contemplar a beleza feminina quando envelhecemos (nós, homens) e já não somos guiados pelo desejo. Felizmente, ainda não cheguei aí. [...] Engana-se quem pensa que a beleza da mulher está no corpo. O que não quer dizer que não há corpos lindos. Mas os corpos, evidentemente, não se prestam à contemplação. O corpo é de tal maneira imanente que, exceto para uns poucos artistas plásticos, o corpo exige a cópula, isto é, o ato, a ação, na qual há prazer e – talvez – entrega e amor, mas não beleza, aquela a que tenho me referido. (Antonio Carlos Olivieri)
Na beleza pode estar contida outra beleza (ou não, cabe a nós transcender e descobrir). Não sei se é só na ausência de desejo que podemos percebê-la -- Kant disse que o "desinteresse" é um dos elementos para atingir a contemplação e o belo transcendente, mas é fato que existe uma diferença entre a beleza sensível e a beleza transcendental, estética, aquela que apraz por mera contemplação e para a qual a ação corpórea (e satisfação dos sentidos) não é elemento sine qua non para que aconteça. A admiração que se sente por uma mulher que satisfaz simplesmente por existir é completamente diferente da que se sente pela que precisa satisfazer o conjunto de exigências moldadas (ou parte), no geral, pelo senso comum dos costumes sociais que, no caso da nossa sociedade, são ditados pelas novelas que começam à partir das 17h.
Não sei se mulheres assim são raras ou se a contemplação é que é pouca, mas aposto mais na primeira teoria, tendo em vista a pandemia social em tentar adequar-se nos modelos ditados pela Globo para tentar se adequar nos padrões de roupagens, tanto de pano quanto de carne, em ambos os sexos. Sendo uma coisa ou outra, só quem sente que pode julgar e dizer.
Sendo assim, da mesma forma que aprecio um Anu Branco no pé da Serra da Cantareira ou o degradê que se forma no por do sol quando estou no alto do Complexo São João lá no Centro, tento prolongar ao máximo os momentos contemplativos quando estou diante de alguém que me apraz simplesmente por existir e ali enxergo a perfeição.
São momentos raros. Mas afinal, que seria da vida sem a beleza?

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