Inusitabilidades

Quisera ter habilidade linguística para expressar quão bizarras -- seria esse o adjetivo adequado? -- foram algumas das noites dessa semana. Claro que, per se, não seriam lá tão esquisitas se não demarcassem uma série de acontecimentos aparentemente desconexos, estranhos, e principalmente contrastam-se com o fato de
que surpreendentemente não estavam envolvidos no curso desses acontecimentos -- tanto durante os dias, quanto durante as noites -- nenhuma balada frenética, etílica ou algo que o valha. Ao que parece, Baco mete o dedo no curso dos acontecimentos tanto dos ébrios quanto dos sóbrios, e o meio científico mostrou-se completamente ignorante (e quando não se mostra?) ao não colocar Hugh Everett III em um pedestal na segunda metade do século XX.
A título de curiosidade, Hugh Everett III (Novembro 11, 1930 – Julho 19, 1982) era um físico americano que propusesse primeiramente interpretação dos muito-mundos (MWI) de física do quantum, que chamou sua “formulação do estado relativo”. Deixou a física após ter terminado seu Ph. D., desanimado na falta da resposta a suas teorias de outros físicos. (wordlingo.com)
Na noite de terça-feira, se bem me lembro, estava no msn quando recebi um convite de um grande amigo  para integrar um projeto que, infelizmente, não posso detalhar. Tal convite me agradou e aceitei de pronto: mas o sistema, Mac OS X, mais multi-tarefa que meu cérebro, me surpreendeu com outro convite, de uma amiga próxima: quando menos percebi, voltei a fazer parte de uma comunidade virtual que outrora integrei, discordei (e tenho lá ainda algumas discordâncias) e saí. "Ao escritor, ao filósofo, pede-se conselho ou opinião, não se admite que mantenham o mundo em suspenso, quer-se que tomem posição – eles não podem declinar responsabilidades do homem que fala", disse Merleau-Ponty, e acertou em cheio. 
Trata-se de um universo virtual, é fato, mas tem lá sua dose de realidade. Não vou citar o argumento do sonho de Descartes para dizer o quanto quando estamos sonhando as coisas parecem tão reais quanto quando estamos acordados e fazer uma comparação com isso, colocarei de outra forma: detrás de cada tela, supõe-se que existem outros seres humanos. Ora, independente da forma que estes seres encontram para se comunicar e interagir, eles continuam sendo humanos.  Claro que, para mim, nada substitui o toque, a troca de olhares, "um olho e outro, […] a mão e a mão, [...] quando se produz [a] espécie de recruzamento, quando se acende a faísca do senciente-sensível", ainda citando Ponty. Acho que para ninguém. Mas existe algo que me atrai na virtualidade -- nessa, em específica, nomeadamente a Equipe do Ikariam, uma espécie de imã, que apesar das doses cavalares de realidade extra-virtual endovenosa que recebo diariamente, ainda encontro tempo para me dedicar a isso. De qualquer forma, essa virtualidade produz e produziu realidade além-tela, seja através de emoções, seja através de deslocamentos ou amizades. Um grande amigo meu da atualidade que almoçava comigo todos os dias no restaurante do banco conheci nessa comunidade.
O tal amigo, aliás, bem lembrado. Ficou puto comigo quando aceitei o tal convite.  Um pouco de overreaction, na minha opinião, mas para mim já deixa evidente que, quando coloco o pé no universo onde se mistura virtualidade e não-virtualidade (a essa altura, já não acho certo colocar a virtualidade à parte das coisas reais), um "ENTER" mal dado pode resultar num cataclisma social. Nada que não me surpreenda, afinal, essas coisas também acontecem pelo telefone, e antigamente, por correspondência -- mas pelo menos antes podia-se correr até a caixa de correspondência e tentar catar a carta antes dela chegar ao destinatário (ou, na pior das hipóteses, subornar o carteiro).
Na quarta-feira, volta do feriado, fui até Guarulhos para descobrir que a aula tinha sido cancelada. O show de organização da Unifesp ficou por conta do e-mail que avisou, às 16h do mesmo dia, que essa aula não seria dada, depois de enfrentar 3h entre percurso de ida e volta da minha casa até o longínquo campus. Algo aconteceu nessa noite, mas minha memória insiste em falhar -- ou será que é impublicável?
Quinta-feira no final da tarde visitei a Mariol. Não via ela há tempos, estava com saudades. Senti uma vontade inexplicável de presenteá-la com algo, em prol do reencontro, da saudade, enfim, da inexplicabilidade dos sentimentos. Ocorreu-me então levar um Girassol... Não sabia se ela gostaria, mas no geral quando faço isso, penso mais no que quero expressar do que no que a pessoa vai achar (claro que me preocupo com a reação, mas, que seja). Ela gostou, botou na mesa de centro da sala. Conversamos, nos atualizamos, matei a saudade, mas lembrei dos tempos em que fazíamos spaghetti com brócolis no vapor. Fica pruma próxima ocasião.
Na sexta, quando achei que meu dia estava terminado, fui até o escritório de um amigo para levar uma documentação e acabamos nos perdendo em um bate-papo que era para terminar às 19h -- quando olhei no relógio, era 21h30. Pouco antes, um amigo -- que conheci na virtualidade, mas trouxe já há muito para fora dela, me convidou para ir ao Rio, e minha intenção era voltar para casa, fazer as malas e pegar um ônibus para lá. Minha falta de noção de horário, a conversa que se estendeu além da conta impossibilitou esses planos, e dei a noite como perdida. Iria voltar para casa de carona com um desses meus amigos mas, sabe-se lá porquê, resolvi pegar o metrô.
Inusitabilidade. É um neologismo? Sei lá. Na noite de ontem, foi peculiar. Há um mês atrás uma garota no campus me chamou a atenção (lá em Guarulhos), mas nunca tínhamos conversado. Quando estava entrando no metrô, topei com ela na porta do trem. Ela me chamou pelo nome, e começamos a conversar... Arrisquei um convite: "o que você vai fazer agora?" Descemos para a Av. Dr. Cesar, e paramos num bar que eu já tinha ido algumas vezes, no geral, sempre bêbado.
Coincidência ou não, ela me disse que não bebia. Eu não estou bebendo, ao menos, estou maneirando no alcool. Pedi dois guaranás. Começamos a conversar sobre tudo, ela contando como foi parar no universo das Letras, e eu, no de Filosofia. Achei interessante ela colocar que o campus parece um "universo paralelo", e parece mesmo. Ao bem na verdade, segundo algumas teorias quânticas, a cada escolha que fazemos caímos em um universo paralelo, mas não indo tão longe nas divagações, a Unifesp Guarulhos de fato parece um mundo à parte, diferente de tudo que se vive fora de lá.
Ingênuo eu de pensar que as bizarrices parariam por aí. Dentre os 11 milhões de habitantes de São Paulo, onde já tinha encontrado a dita cuja, passou na mesma calçada um amigo que conheço há 8 anos e não vejo há 2. Inconvenientemente e sem perguntar, sentou-se à mesa e pediu uma cerveja. Tão inusitado quanto tudo que aconteceu, a garota simplesmente levantou-se e, sem dar a chance para o recém chegado fazer o mesmo, foi embora.
Deixei os guaranás -- e o amigo -- na mesa e tentei argumentar que ele iria embora. Vi que não iria adiantar. Voltei e ele ainda estava lá. Ora, entre uma quase viagem ao Rio, uma garota que nunca tinha trocado uma palavra e um amigo que não via há quase 2 anos, já era tempo de parar de me mexer por um instante. Dentre as diversas escolhas que se apresentaram, se cada uma é um universo, transitei por vários deles em questão de poucas horas, em uma noite. Já passava das 23h quando resolvi, na Dr. Cesar, em Santana, que ficaria ali sentado com meu amigo papeando. Tudo foi muito legal. E dane-se: além das cervejas dele, ele pagou os guaranás!

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