Antes de Entrar no Elevador

Esperar o elevador no prédio aqui da avenida São João onde trabalho assemelha-se a aguardar a lotação no ponto de ônibus na zona norte de domingo. Faça chuva ou faça sol, é uma demora sem fim. Às vezes, quando há paciência , dá tempo de pensar um pouco na vida. Quando falta, recorro ao celular, sms ou twitter, visto que ao contrário dos ambientes abertos, graças ao governador de São Paulo já não é permitido fumar enquanto se espera.
Não é via de regra, mas de vez em quando acontecem coisas peculiares, tanto na espera do ônibus, quanto do elevador. Outro dia olhei para o lado e vi um senhor franzino, de quase uns 70 anos, que tinha certeza de ter visto em uma animada conversa na Avenida Paulista algumas semanas antes quando fui entregar um documento no prédio da Superintendência. Chamou-me a atenção o fato de que ele usava uma camisa branca listrada e chapéu coco preto, o que por um instante lembrou-me Laranja Mecânica.
Cerca de oito minutos depois, já que o elevador não aparecia, resolvi puxar conversa:
-- Bom dia! Que demora hein!
-- Sempre. Tudo demora. A vida é um “troço” demorado – e abriu um sorriso.
Achei um pouco hiperbólico, mas continuei:
-- Demoraria menos, não fosse o tempo que perdêssemos esperando elevador, ônibus, trem, metrô...
-- Antigamente perdíamos andando, subindo escadas...
-- Exercitando os músculos – retruquei.
-- Hoje em dia lemos – ele respondeu, desafiador.
-- Não. Hoje ficam escutando funk. Os livros estão em baixa.
-- Gente burra sempre existiu, não é culpa do elevador – ele deu o veredito.

Foi um debate rápido, mas divertido. O elevador ainda não tinha chegado, então, resolvi passar às trivialidades e aliviar a tensão:
-- O senhor trabalha por aqui?
-- Na realidade não. Trabalho em quase todos os prédios da cidade.
-- Sério? O que você faz?
-- Faço isso. Converso. Papo rápido. Nesse corre-corre de São Paulo, a única hora em que se pára “pra” conversar é essa: na hora de esperar o elevador. Ou dentro dele. E quase sempre com um desconhecido. Às vezes é um bom dia, boa tarde, boa noite. É toda a conversa do dia.
Papo de louco. Por sorte, a campainha tocou, sinalizando que em breve o elevador abriria as portas e eu poderia ir para o 13º andar. Estendi a mão em um último gesto de cortesia:
-- Bem, foi um prazer. Meu nome é Filipe. E o seu?
-- O prazer foi todo meu. Meu nome é O Mesmo.

Nota: Para mau entendedor (e há), clique aqui.

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